As florestas e a água




Nuno Leitão

As florestas têm grande influência na precipitação antes de chegar ao solo, interceptando e redistribuindo a água.

No inicio do século XX existiam várias dúvidas quando se abordava a questão da influência das florestas no ciclo de água. Dizia-se que, comparativamente com outros cobertos vegetais, as florestas eram responsáveis pelo aumento de precipitação e de humidade. Desta forma numa dada área, a remoção do coberto florestal implicaria a diminuição da precipitação e consequentemente a diminuição do caudal das linhas de água.

Em meados do século, estudos realizados em florestas temperadas permitiram verificar que parte das diminuições de precipitação associadas à remoção das florestas, deviam-se essencialmente à redução de intercepção do nevoeiro que provoca o gotejo, tendo o seu efeito directo na precipitação pouca importância (verificou-se apenas diminuições de precipitação total de cerca de 5% no máximo).
No caso da Amazónia, floresta tropical de grande área, reconhece-se a sua influência significativa na humidade da atmosfera e precipitação (30%) numa larga área de zonas adjacentes. Em zonas como na Escandinávia, a influência das florestas é pouco importante, devido aos padrões de precipitação serem essencialmente geridos pelas cadeias montanhosas que interagem com as massas de ar em movimento. Mas note-se, que as florestas não deixam de ser responsáveis pela criação de microclimas húmidos.
 A importância das florestas para a precipitação deve-se sobretudo à capacidade que estas têm de a interceptar e redistribuir.
O coberto florestal intercepta muita da precipitação, e apenas uma pequena parte desta chega à superfície do solo. Da mesma forma, a maior parte do orvalho ou da geada é acumulada pelas árvores durante a noite para evaporar na manhã seguinte. O regresso da água interceptada à atmosfera depende da capacidade do coberto para a interceptar, da energia disponível (em forma de radiação solar) para a evaporar e do movimento e humidade do ar. A evapotranspiração (evaporação da água interceptada e transpiração da água dos tecidos vegetais) nas florestas é 3 a 5 vezes superior à que se verifica em cobertos rasteiros em condições climatéricas idênticas. As florestas têm maior altura, maior rugosidade aerodinâmica portanto, e quando há movimento do ar cria-se uma atmosfera turbulenta que facilita as trocas de vapor entre as árvores a atmosfera, o que implica a maior evaporação. Por outro lado, as árvores exploram água num maior volume de solo pelo que têm maior transpiração.


A água interceptada pelas copas das árvores pode ser redistribuída também, para o solo, directamente ou por queda dos ramos e das folhas (precipitação interna) ou por escorrimento pelo tronco. A água que atinge o solo pode escorrer pela superfície ou infiltrar-se. Nos solos florestais a infiltração é normalmente rápida devido à existência de elevada porosidade e material orgânico que permite armazenar a água, o que leva a que os escorrimentos superficiais sejam curtos. Parte da água infiltrada pode ser absorvida em conjunto com nutrientes pelas raízes das árvores, e translocada para a parte aérea onde pode ser transpirada.
A água que não é evapotranspirada e não fica armazenada no solo pode ficar armazenada em lençóis freáticos ou chegar às linhas de água.
O tempo que a água leva a chegar à linha de água depende de ter sido infiltrada ou escoada. O movimento da água no solo depende da textura e estrutura deste. Um solo fino e de textura grosseira entrega rapidamente a água da precipitação às linhas de água, mesmo quando não ocorre escorrimento superficial, enquanto que um solo de textura fina, fundo ou com grandes quantidades de matéria orgânica armazena água e a chegada desta às linhas de água é retardada. A partir do momento em que a capacidade de armazenamento de água pelo solo é excedida, a contribuição para o caudal das linhas de água deixa de estar dependente das características do solo. 
Bibliografia

Kimmins, J. P. (1997). Forest Ecology. Prentice-Hall, Inc.
Fonte: http://naturlink.sapo.pt/Natureza-e-Ambiente/Interessante/content/As-florestas-e-a-agua?bl=1

 As Florestas de alimentos




Um dos métodos que mais fascina no mundo da Permacultura são as florestas comestíveis ou agroflorestas deixo aqui uma entrevista com o Ernst Gotsh uma das pessoas mais entendidas do Brasil neste tema da transição das florestas.








P: Quais são as bases de sua experiência em agrofloresta?

Ernst: A participação de cada espécie na natureza sempre traz um superavit energético. A prova é a recuperação natural dos locais esgotados, que se inicia pelas espécies mais rústicas, mas sempre levando, depois de um tempo, ao aumento da biodiversidade. É a substituição da concorrência e competição fria, que causa escassez, conflito e falência por um sistema inteligente, baseado nos princípios do amor e cooperação entre as espécies. Com esta constatação, fica óbvio que é mais lucrativo enriquecer os sistemas do que explorá-los. Exploração é quase sempre insuportável.

P: Tecnicamente a agrofloresta é viável?

Ernst: Não só viável, como de menor custo e maior lucro. As técnicas tradicionais de agricultura, como o fogo, a capina e o arado são substituídas por uma convivência harmoniosa e criativa com as espécies, que cria um sinergismo lucrativo. O que regra as relações é que cada espécie aumenta a quantidade e qualidade de vida se cada uma cumprir a função prevista para ela. O homem não é inteligente, ele faz parte de um sistema inteligente. Se trabalharmos com o potencial dos sistemas, a presença humana deixa de ser inoportuna. Trata-se simplesmente de criar plantações com dinâmica parecida com os ecossistemas locais.

P: Na prática, como funciona o sistema de agrofloresta?

Ernst: Um principio é a diversidade , outro é o uso dinâmico da sucessão natural. No mesmo dia e local em que plantássemos o arroz, plantaríamos o milho, bananas, mandioca, guandu e mamão, todos em densidade como se fossem para monocultivo e árvores de todo tipo, em alta densidade, dez sementes por metro quadrado. A agrofloresta é um ser vivo, que tem relações de criadores e criados, os que tem ciclo de vida curto são criadores, como milho, feijão e mandioca. Os criados são os de ciclo longo, as árvores, por exemplo. Usamos uma estratégia revertida, principalmente em terrenos que não estão preparados. Começamos com as espécies menos exigentes, ao contrário do processo habitual, que parte da queima e uso da terra até seu esgotamento. A queimada leva a uma escala descendente de aproveitamento do solo, com plantio de espécies exigentes nos primeiros anos, um esgotamento rápido do solo e o plantio de espécies cada vez menos exigentes. Sem a queima, o processo é revertido, enriquece-se o solo com as espécies menos exigentes e inicia-se a capitalização para o plantio posterior das espécies mais exigentes.

P: A agrofloresta pode dar resposta a uma agricultura voltada para o consumo de massas?

Ernst: Sim. Uma grande empresa multinacional, há três anos, concluiu que agricultura não deve ser negócio para grandes empresas, mas para pequenos produtores, agricultura familiar. Passaram a investir em seringais consorciados em agroflorestas, com cacau, açaí e produtos de subsistência. Aliado às espécies silvestres, o homem teria muito mais oferta protéica, inclusive, do que criando bois. Sem o uso de fogo, que é uma ironia, porque resulta na expulsão da espécie humana. As pesquisas indicam que a implantação de agroflorestas não diminui a produtividade relativa de cada espécie plantada. Uma experiência na Bolívia resultou em quatro a cinco por cento menos de arroz do que se fosse em monocultivo, mas três meses depois, colheu-se o mamão, mais três meses, sem nenhum trabalho além de colher, obteve-se uma segunda colheita pequena de arroz, com um ano e dois meses veio a banana, depois a mandioca, com dois anos e pouco os primeiros cacaueiros, e com quatro anos os primeiros resultados florestais, em frutíferas e madeiras.




P: Uma mudança mais geral nos paradigmas da agricultura, na direção destes princípios agroflorestais. Você acha possível? Em quanto tempo?




Ernst: As mudanças de paradigmas são processos lentos e são favorecidos por pressões da própria natureza. No Brasil, com seus ecossistemas ricos, os riscos de colapso podem demorar, mas existem sinais claros de que chegarão. É mais gratificante ver numa agrofloresta próspera o superávit e a função humana como dispersora e não devastadora. Existem experiências centenárias, como a cafeicultura sombreada na América Central, consorciada a cítricos e diversas árvores, derrubados como obsoletos e substituídos por sistemas de monocultura. Agora teremos que fazer o caminho de volta para a natureza. De volta às matas e a um tipo de consciência que devolverá ao homem sua condição de espécie amorosa e cooperativa.

















O que é e como se inicia uma horta ecológica


O cultivo de alimentos é tipicamente visto como uma forma de arte ou trabalho duro e pesado. Não é de admirar que poucas pessoas pensem em fazê-lo num nível sério. Mas e se surgir uma técnica que seja tão fácil e tão prolífico que, mesmo o mais ocupado executivo da empresa poderá fazer crescer uma quantidade significativa dos alimentos para a família em menos tempo do que leva a deslocação aos mercados. A agricultura ecológica pode ser a resposta. 



As minhas hortas não foram diferentes de qualquer outras durante muitos anos, pois tinha a referência de agricultura biológica do meu avô, mas em modo tradicional de manutenção, pelo que ia fazendo gradualmente algumas mudanças. A primeira e provavelmente a mais significativa foi adensar as plantas muito mais numa determinada área. A segunda mudança foi a de não escavar o solo, e em terceiro lugar, melhorei o sistema de compostagem. 



Uma vez que estas estratégias simples estavam em prática notei a horta a criar vida própria. As ervas chamadas “daninhas” praticamente pararam de crescer nos canteiros e as plantas começaram a viver muito mais tempo. A horta podia suportar longos períodos sem água, produzia mais do que necessitava e podia colher em todos os dias do ano. Depois de algum tempo consegui aquilo que pretendia, criar um ecossistema composto de plantas comestíveis, que se comporta exactamente da mesma maneira que um habitat natural. E em tal situação passamos a um observador mais que um agricultor, à medida que a natureza toma as rédeas das dinâmicas da horta. 



Uma coisa maravilhosa na natureza é que ela trabalha incansavelmente, 24 horas por dia, sete dias por semana. A Natureza segue leis muito simples e funciona da mesma forma, em qualquer sistema, em qualquer lugar do mundo. Quando criamos um jardim ecológico, estamos a criar um sistema vivo. Ao entrar por ai, temos a natureza a trabalhar para nós, e não contra nós



O que são nichos ecológicos e porque são importantes 



Um ecossistema primitivo é composto de milhares de componentes vivos e não vivos todos coexistindo numa determinada área. Cada componente de vida ocupa o seu nicho próprio e isto é o mais importante de compreender, ao criar um jardim ou horta ecológicos. 
Num ecossistema natural, cada espaço deixado livre é imediatamente ocupado por muitos seres e espécies, lutando desesperadamente pela sobrevivência e dominância. 



Quando olhamos para uma horta tradicional nesta perspectiva, o que vemos é um sistema muito antinatural. Há uma diversidade muito pequena e muitos nichos vazios. A natureza impõe a sua vontade e leis sobre as hortas, exactamente da mesma maneira que em qualquer outro ecossistema, e isso significa que os espaços vazios serão preenchidos o mais rapidamente possível. 



No entanto, numa horta tradicional não existem sementes desejáveis á espera para preencher os espaços disponíveis, ao invés, surgem as ervas daninhas das sementes que lá estavam. 



A solução é criar uma horta que tenha preenchido todos os nichos disponíveis, para que as ditas ervas daninhas não tenham oportunidades. Podemos fazer isso ao plantar a horta muito bem, com uma gama diversificada de plantas hortícolas de diferentes formas e características. O resultado é uma plantação em sistema denso. A densidade também cria um micro-clima altamente protegido. Esse ambiente ideal de crescimento faz com que suas plantas possam durar muito mais tempo. 



Como gerir uma horta/jardim ecológico



Gerir uma horta ecológica é diferente de uma horta tradicional. Há muito menos que fazer. O nosso papel é mais de observador e regulador pontual em que se constata o espaço num estado contínuo de mudança suave, como um ecossistema natural. Isso pode ser difícil, pois nós, seres humanos, temos a tendência de controlar e interferir com todas as coisas. Este estilo de agricultura requer uma grande dose de fé e confiança nas leis naturais. Claro que haverá momentos em que é necessário intervir e direccionar o sistema na forma que pretendemos, no entanto, isso é quase sempre porque determinadas espécies de plantas hortícolas estão com muito sucesso e o ecossistema está em risco de perder a diversidade. 



Gestão de Pragas



A natureza densa e misturada de forma natural na horta ecológica, contribui muito para a gestão de pragas pela forma da prevenção. As pragas geralmente localizam a sua planta espécie-alvo através da visão ou cheiro. Imagine-se o quão mais difícil é ver a planta-alvo quando o seu contorno é obscurecido por um mar de verde. E como na terra poderia sentir o cheiro da sua planta-alvo quando há tantos cheiros misturados e em conflito, pelo que não podemos esquecer a escala, pois tratando-se de insectos tudo é enorme e muito distante. 





Elimina a necessidade de rotação de culturas 
A rotação de culturas é praticada pelos jardineiros dedicados por uma razão muito boa. Plantas diferentes requerem diferentes minerais do solo, em diferentes proporções. Depois que uma área foi plantada com uma determinada espécie, o solo pode ficar empobrecido de certos minerais. Para diminuir os efeitos desse empobrecimento e desequilíbrio, uma cultura diferente será plantada no ano seguinte. 



Uma técnica de fertilização natural, periodicamente cultivam-se plantas leguminosas que funcionam como adubos verdes, como sejam ervilhas, favas ou trevos. Estas plantas absorvem o nitrogénio da atmosfera e libertam-no para a terra através das raízes. 



No entanto, a rotação de culturas não é necessária na agricultura ecológica, pois plantio misto neutraliza os efeitos da depleção mineral, sendo que uma única espécie não domina uma única área. Da mesma forma, o adubo verde não é necessário por o nitrogénio ser abastecido de duas maneiras. Em primeiro lugar, através da plantação de leguminosas comestíveis, como ervilhas e feijões dentro da mistura. E em segundo lugar, pela adição de composto na superfície de todas as áreas desprotegidas. 



Compostagem



O composto é uma parte importante do jardim ecológico e é um bem muito valioso, neste blog há outros artigos mais específicos sobre compostagem mas faço aqui também um resumo. A compostagem é uma forma de construção de nutrientes valiosos alimentam a terra, as plantas e no final, a nós próprios. Deitamos fora grandes quantidades de restos orgânicos das coisas que compramos e na verdade estamos a comprar nutrientes, e a deitá-los para o lixo, numa perspectiva de ecologia. É um fluxo de nutrientes que flui numa única direcção, com um camião do lixo como agente final.



Ao fazer compostagem utilizamos os nutrientes de novo, não tendo que comprá-los pela segunda vez. Na verdade, estamos criando um sistema que é auto-sustentável. A compostagem é um veículo em que somos capazes de criar um ciclo de nutrientes dentro da nossa propriedade em que voltam para a compostagem e, lentamente, fazem o caminho noutra forma útil de consumo. Este ciclo pode continuar indefinidamente. 



Deitar fora a enxada 



Os ecossistemas naturais não necessitam de jardineiros com pás e enxadas para em cada temporada transformar o solo, e a horta também não. No entanto, é melhor não andar e pisar os canteiros da horta pois isso irá causar compactação desnecessária. É claro que isso requer a instalação de vias permanentes, que são posicionados de forma que o jardineiro pode ter fácil acesso ao terreno. 



Cavar o solo perturba a estrutura do mesmo o que, por sua vez, reduz a capacidade de transferir valiosos nutrientes para as plantas. A perda de estrutura do solo também reduz a capacidade de reter água. Desenvolver uma boa estrutura é realmente a melhor técnica de conservação de água, e quando praticado em conjunto com plantação densa, cria um gestão do solo holística em ecologia. 



A plantação densa cria sombra sobre a superfície dos solos, eliminando o encrostamento superficial, que provoca o escoamento e esgotamento de nutrientes. Desenvolvendo uma melhor estrutura permitirá aos organismos o que eles fazem melhor - transformar matéria orgânica em nutrientes disponíveis, como resultado de um solo rico e vivo. 



Auto Sementeira



Se tivermos a sorte de visitar uma floresta tropical intacta ficaremos fascinados pelas copas altas. No entanto, o futuro da floresta tropical está no solo em forma de sementes - pequenas células de vida à espera da sua oportunidade de prosperar. Se vamos criar um jardim/horta ecológico, então temos de ter a certeza de que terá um futuro. 



Ao permitir que algumas plantas produzam sementes, podemos construir reservas das mesmas, tal como a floresta tropical. E também como na floresta tropical, devemos ter o objectivo de milhares de sementes de muitas variedades espalhadas por toda a parcela. 



A maioria dessas sementes nunca irão germinar, porque na horta ecológica os nichos estão tão cheios, que as oportunidades para uma germinar são limitadas. No entanto, eventualmente, uma planta vai ser removida e comida e um espaço nicho fica vazio. Se existem inúmeras sementes dormentes, as hipóteses do nicho vir a ser preenchido são certas. 



Método da horta Ecológica-os princípios fundamentais



1. Plantar densamente 
2. Plantar uma diversidade de plantas dentro de uma determinada área 
3. Obter um bom sistema de compostagem 
4. Permitir que algumas plantas de cada espécie produzam sementes 
5. Só interferir com o sistema quando uma única espécie de planta sobre domina e nesse caso, simplesmente remover as plantas em excesso quando são pequenas. 



O cultivo de alimentos não é um trabalho árduo, especialmente com a natureza a ajudar. Uma área pequena pode fornecer elevadas recompensas em comida, poupando muito dinheiro por ano. A coisa mais interessante neste método é que saber que podemos ignorar a horta por semanas e não ser um problema.